O teste de impairment, ou teste de recuperabilidade, é regulamentado na contabilidade pelo CPC 01 (R1) (BRGAAP), e pelo IAS 36 (IFRS).

A norma contábil demanda que as companhias realizem o referido teste de recuperabilidade anualmente para os ativos sem vida útil definida (usualmente goodwill / ágio por recuperabilidade futura, e marcas e patentes) ou também em situações em que existam indicativos de perda de recuperabilidade, como prejuízos recorrentes, mudanças mercadológicas ou novas tecnologias. Com a proximidade do fim do ano fiscal de 2023, este tema ganha especial relevância.

O teste de impairment é destacado como item de atenção de forma recorrente pela CVM em seus ofícios circulares anuais com Orientações as companhias abertura sobre a preparação de suas demonstrações contábeis.

A CVM deu muita ênfase ao assunto no período da pandemia do COVID-19, tendo em vista a grande incerteza e volatilidade que as restrições impuseram as economias e as companhias, e também em seu ofício de 2023, no qual o órgão destacou o item 134 do pronunciamento, que indica os pontos de divulgação mínimos acerca do teste de recuperabilidade realizado.

Se a COVID trouxe muitas notícias negativas, com o avanço da vacinação e reabertura completa das economias, a retomada das companhias traz também possibilidade de reversão de baixas por impairment anteriormente reconhecidas. A norma do CPC-01, prevê em seus itens 109 a 125 as regras para a reconhecimento e divulgação de uma reversão de perda por recuperabilidade. Todavia, muito importante destacar que isso é permitido apenas para itens com vida útil definida, mas não para o goodwill (conforme item 124).

O Tamanho e Relevância do Goodwill

Em estudo de 2021, a CFA Society trouxe a tona alguns aspectos sobre a contabilização e tratamento posterior do Goodwil (“Goodwill: Investor Perspectives por Sandra J. Peters 2021). Neste estudo, é destacado como este intangível vem ganhando relevância proporcionalmente no balanço das companhias de capital aberto em todo o mundo. Com o elevado volume de M&A realizado pelas companhias como estratégia de crescimento acelerado inorgânico ou também para diversificar seus ramos de atuação, tecnologias ofertadas ou inovações, o goodwill (ágio) é cada vez mais relevante e, consequentemente, o teste de recuperabilidade torna-se um dos principais itens de atenção e discussão na preparação das demonstrações financeiras.

Principais Pontos de Atenção

A equipe da Grant Thornton possui grande experiência tanto na preparação dos testes de recuperabilidade junto a controladoria e alta administração de seus clientes, como também atuando como revisores no processo de auditor ia das demonstrações financeiras de diversas companhias de capital aberto e familiares/de capital fechado.

Com base nos casos observados nos últimos anos e discussões mantidas com nossos clientes, alguns dos principais itens de atenção na aplicação do teste de impairment que podemos destacar são:

1. Definição de Unidade Geradora de Caixa (UGC x CNPJ):

O pronunciamento do CPC 01 demanda que o Teste de Recuperabilidade seja realizado sempre na menor Unidade Geradora de Caixa (UGC) possível e acompanhada pela administração, e os itens 66 a 73 trazem orientações e exemplos quanto a forma de determinação disso. Este é um item que costuma trazer complexidade ao exercício do teste e muitas vezes não é devidamente endereçado. Sempre importante que seja analisado que:

i. muitas vezes os CNPJs de um grupo econômico podem não ser a melhor forma de traduzir as UGCs pois mais de um CNPJ podem compor determinada linha de negócio, bem como

ii. um mesmo CNPJ pode contemplar diversas UGC. Ademais, importante também sempre analisar se, por exemplo, existem receitas e despesas reconhecidas em determinado CNPJ e Balancete contábil que, na verdade, devem ser atribuídas e outra UGC ou, então, rateadas entre as linhas de negócio para a realização do teste de recuperabilidade.

2. Definição do Carrying Amount (necessidade de inclusão de Imobilizado e Capital de Giro):

O item 76 do pronunciamento indica que a base de ativos testada (usualmente chamada de Carrying Amount), deve contemplar a base de ativos e passivos que possibilitam a geração de caixa considerada para a estimativa do valor em uso.

Em grandes linhas, a principal interpretação e orientação que obtemos aqui é que a base de teste não pode ser apenas o ágio ou os intangíveis de vida útil indefinida, mas sim o grupo e a totalidade de ativos e passivos que geram este fluxo de caixa. Destacamos aqui a inclusão na base de teste o imobilizado, a base de capital de giro e eventualmente o Imposto de Renda diferido caso o aproveitamento de prejuízos acumulados esteja sendo considerados na definição do valor em uso. 

Em suma, o mais relevante é que seja garantida a coerência entre a base de ativos testados e o fluxo de caixa projetado para o valor em uso.

3. Prazo de projeção (não mais que 5 anos em regra):

O item 134, por sua vez, traz uma regra também muitas vezes não observada na preparação dos estudos, referente ao prazo das projeções. Este item indica que as projeções e orçamentos devem, em regra, respeitar o limite de 5 (cinco) anos de forma explicita, a não ser que devidamente justificado. Isso não quer dizer que nunca podemos utilizar uma projeção mais longa, porém agrega uma camada de subjetividade e exige que o estudo explique por que optou por estender o prazo caso aplicável.

4. Vedação a consideração de melhorias ou reestruturações:

Outro item pertinente e que costuma gerar debate na preparação dos testes é referente a futuras melhorias e reestruturações do ativo. O item 44 do pronunciamento veda expressamente que tais itens sejam considerados na construção das projeções de fluxo de caixa que venham a embasar o estudo de valor em uso. Desta forma o ativo ou UGC deve ser estimado considerando seu estado atual, ou seja, sem novas tecnologias ou versões ainda não lançadas, unidades ainda não existentes ou reduções de custo / despesas ainda não aprovadas ou com evidências concretas.

5. Taxa de desconto e perpetuidade (conciliação de métricas nominais e reais):

Por último, destacamos o item da taxa de desconto e taxa de crescimento na perpetuidade (g) a ser considerada na definição do valor em uso. Este item permeia qualquer exercício de valuation, e é essencial que seja confirmado sua coerência com as premissas consideradas na construção do fluxo de caixa, sendo os principais itens de observação:

i. termos reais x nominais

ii. regime de tributação x tax Shield na taxa de desconto

iii. taxa de perpetuidade não deve exceder taxas que possam ser comprovadas para o produto, país ou mercado em que opera.

Conclusão

Como demonstrado e enumerado ao longo do material, o exercício do teste de impairment / recuperabilidade, além de caráter técnico e subjetivo, possui diversas complicações e nuances que se não forem bem endereçadas e documentadas, acaba por trazer riscos e potenciais impactos significativos na divulgação das demonstrações financeiras da companhia.

A baixa ou perda por impairment, por exemplo, pode ter impacto relevante no lucro líquido de determinado exercício e, assim, definir a capacidade da companhia em distribuir dividendos.

Conte com nossa equipe para lhes auxiliar seja na preparação do teste, seja em projetos de consultoria na discussão de temas específicos ou documentação de itens técnicos.

Autor

  • Autor

    Rodrigo Nigri

    Sócio de Estratégia e Transações da Grant Thornton Brasil