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CCO a CCI: Compliance hoje é influência, não só conformidade

Alessandro Gratão
Por:
Equipe reunida em conjunto
Esse jogo de palavras de CCO (Chief Compliance Officer) para CCI (Chief Compliance Influencer) trata-se de uma brincadeira, mas com grande fundo de verdade, a qual reflete o perfil requerido na atualidade para o líder de Compliance.
Destaques

Durante muito tempo, o papel do Compliance nas organizações foi associado à vigilância, ao controle e à conformidade normativa. Um papel essencial, mas muitas vezes visto como reativo, técnico e isolado das decisões estratégicas e da realidade frente aos desafios do negócio. No entanto, essa percepção vem mudando de forma significativa.

Hoje, o líder de Compliance é chamado a desempenhar uma função muito mais ampla: atuar como agente de cultura, parceiro de negócios e, acima de tudo, influenciador ético nas decisões corporativas. Mais do que zelar por normas, espera-se que ele seja capaz de moldar comportamentos, engajar lideranças e dialogar com todos os níveis da organização. 

Esse artigo explora exatamente esse novo perfil: o do profissional de Compliance que influencia com propósito, promove escolhas conscientes e impulsiona a integridade como valor de negócio.

O novo perfil do profissional de Compliance

O modelo tradicional do Compliance Officer está em transformação. Se antes bastava dominar regulamentos e implementar controles e, em alguns casos, atuando até de modo policialesco, hoje é preciso compreender profundamente o contexto de negócios, interpretar riscos com visão estratégica e, principalmente, construir relações de confiança que possibilitem influenciar decisões.

Esse novo perfil exige habilidades que vão além da técnica, como demonstrar facilidade de comunicação, empatia, escuta ativa, negociação, inteligência emocional e pensamento sistêmico. Em vez de ser visto como “quem diz não”, o líder de Compliance passa a ser reconhecido como “quem ajuda a dizer o sim certo”, equilibrando objetivos comerciais com princípios éticos.

Por que o Compliance precisa ser influente?

Influência não é um privilégio — é uma necessidade. Em um ambiente corporativo complexo, onde decisões são tomadas com agilidade e sob pressão, o profissional de Compliance que não consegue influenciar pode ser ignorado, mesmo quando sua análise está correta.

Casos públicos emblemáticos como os da Volkswagen (Dieselgate) ou da Wells Fargo mostram que, muitas vezes, havia alertas internos — mas as vozes de alerta não foram ouvidas com o peso necessário. Em muitos escândalos corporativos, o problema não foi a ausência de um programa de Compliance, mas sim a sua irrelevância no processo decisório.

Influenciar significa estar presente nas conversas-chave. É garantir que a lente da ética esteja sobre a mesa quando decisões importantes são tomadas — do lançamento de um produto, composição de um algoritmo à entrada em um novo mercado, da escolha de um fornecedor à política de remuneração da força de vendas.

As habilidades de influência do líder

Ser influente não é ser autoritário, e muito menos depender de hierarquia. É, sobretudo, construir legitimidade. Abaixo, um framework prático que resume as habilidades-chave de influência para o profissional de Compliance, com base no acrônimo I.N.F.L.U.E.N.C.E.:

  • Integridade como ativo central: a autoridade moral nasce da coerência entre discurso e prática.

  • Narrativa envolvente: traduzir riscos e dilemas éticos em histórias que conectem com a realidade do negócio.
  • Foco no negócio: compreender o core da empresa para falar com propriedade e gerar soluções que respeitem os objetivos estratégicos.
  • Liderança informal: influenciar mesmo sem “caneta”, sendo referência por conhecimento, equilíbrio e postura.
  • União com áreas-chave: formar alianças estratégicas com Jurídico, Riscos, Segurança da Informação, Auditoria, RH e TI.
  • Escuta ativa e empatia: entender as dores reais de cada área e adaptar a comunicação.
  • Negociação de riscos e soluções: apresentar alternativas viáveis, em vez de apenas apontar proibições.
  • Comunicação clara e acessível: traduzir temas técnicos para diferentes públicos, com assertividade.
  • Exemplo pessoal: ser modelo de comportamento ético no dia a dia.

Barreiras à influência do Compliance e como superá-las

Nem sempre o caminho é fácil. Barreiras comuns incluem:

  • Percepção de “área impeditiva”;
  • Pouca exposição aos fóruns estratégicos;
  • Desconhecimento técnico por parte da liderança;
  • Resistência cultural à mudança.

Para superá-las, o profissional de Compliance deve investir continuamente no seu repertório técnico e comportamental. Precisa também buscar uma linguagem que conecte riscos à linguagem de valor — seja esse valor financeiro, reputacional ou humano. 

Influenciar, afinal, é ajudar a liderança a enxergar que fazer o certo é também fazer o melhor para o negócio.

O futuro é de quem influencia

O futuro do Compliance não será apenas regulatório — será relacional, estratégico e cultural. A influência será a ponte entre o conhecimento técnico e a transformação ética nas organizações.

Compliance de verdade joga no ataque, para mudar comportamentos, não basta defender regras, é preciso influenciar o jogo estando no lugar onde tudo acontece. É mais convencer do que advertir, tornando a Ética viável na rotina diária de decisões.

Portanto, é hora de ampliarmos nossa caixa de ferramentas: cultivar habilidades humanas, construir pontes com a liderança e mostrar que integridade também é uma vantagem competitiva. O líder de Compliance que souber influenciar não será apenas ouvido — será indispensável.